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Copérnico e Galileu: a Revolução científica do séc. XVII

 2ª. parte

Considerando o exposto na primeira parte deste artigo, publicada na edição anterior, passamos a apresentar, agora, alguns aspectos trazidos por Nicolau Copérnico: se os resultados intelectuais axiomáticos de Copérnico surtiram, em certa proporção, uma nova visão na sociedade vigente, entretanto, os indivíduos ainda estavam reticentes, principalmente na Europa. O posicionamento da Igreja Católica não era perseguir aqueles que eram favoráveis aos argumentos de Copérnico, se elas os considerassem como meras hipóteses, e não como fato consumado. Até porque para que se pudessem considerar os axiomas de Copérnico como fatos respaldados pelo empirismo, deveria haver um conjunto de instrumentos para que a experiência tivesse condições de dar veracidade aos fatos de que a Terra gira em torno do sol, possuindo ao mesmo tempo com seu respectivo movimento diário. Eis que entra em cena Galileu Galilei, famoso matemático italiano, nascido em Pisa, e logo se transfere para Florença, onde trabalha como professor de matemática, após abandonar o curso de medicina, que tanto desejava seu pai.

Galileu imediatamente adota o copernicanismo como algo a ser defendido com ‘unhas e dentes’. No entanto, demover as pessoas e mesmo os elementos da Igreja Católica acerca do movimento da Terra não era tarefa fácil. Portanto, Galileu passa a traçar estratégias que se tornariam bastantes eficazes no instante de provar o movimento da Terra. Para isso, teria que desenvolver recursos empíricos pertinentes no sentido de dar apoio às teses defendidas por Copérnico. Galileu percebera que algumas concepções tradicionais deveriam ser desfeitas com demonstrações apuradas, a fim de demonstrar com suficiente segurança à sociedade da época, o grau de verdade contido nos axiomas de Copérnico. A principal idéia defendida pelos peripatéticos, os aristotélicos do século XVII, era a de que se a Terra se movesse, então todos os corpos se projetariam para frente. O exemplo típico para se ilustrar o que se dizia concerne exatamente no fato de que se lançarmos um objeto do alto de uma torre, ele jamais poderia cair no pé da própria torre, mas, ao contrário deveríamos encontrá-lo metros de distância da torre. Além disto, se a Terra tivesse movimento rotacional os mesmos corpos, inclusive os seres vivos, seriam lançados como uma pedra presa a uma funda quando girada em alta velocidade por nossas mãos. Isto significa que a força centrípeta entra em ação com grande intensidade.

A resposta de Galileu é imediata, enfatizando muito claramente ao discutir o famoso exemplo da bola que cai do alto do mastro de um navio. Galileu afirma que a bola somente cai no pé do mastro, simplesmente porque a bola participa do movimento do próprio navio, e não há razão alguma para concluirmos que só pelo fato de que a embarcação está caminhando para frente que a bola deveria realizar o caminho no mesmo sentido. Isto é o que os físicos e historiadores da ciência chamam de ‘relatividade do movimento’ dos objetos em relação ao movimento de um corpo maior que os envolve. Contudo, não é apenas esta concepção que Galileu tem que desfazer, há uma outra, que segue a física do senso comum aristotélica, colocada no começo do texto. Dizia Aristóteles, que os corpos mais pesados caem com uma velocidade maior em relação a corpos mais leves. Isto de fato ocorre, entretanto, faz-se necessário uma meticulosa análise experimental em torno desta asserção, pois Galileu passa a desconfiar de seus resultados. Galileu, desta forma, passa a desenvolver experiências utilizando-se sobretudo, de certos recipientes de vidro com líquidos cujas densidades são distintas. A seguir, Galileu joga esferas com massas (pesos), diferentes em cada um destes recipientes, e observa que a cada passo do experimento a esfera que possui massa menor, se aproxima cada vez mais daquela que tem massa maior. Isto implica dizer que quanto menor a densidade do meio, maior é a aproximação entre as duas bolas. O que equivale a constatar que o tempo de queda entre uma e outra é menor. Esta observação feita por Galileu trará concomitantemente uma conseqüência interessante, porque ele imagina que em um meio onde não haja alguma densidade, os corpos esféricos tendem cair ao mesmo tempo, além de que continuariam perpetuamente o movimento. Esta é a constatação da inércia, que Galileu não explicitou. Na lua, por exemplo, os astronautas, acabaram por verificar os resultados de Galileu, pela razão de que tal ambiente é desprovido de densidade.

Uma outra contribuição pertinente de Galileu reside na construção e desenvolvimento do telescópio. È preciso antes de tudo, desfazer da idéia comum de que o matemático pisano foi o autor da invenção. Não se sabe com certeza  o autor de tal objeto, mas podemos asseverar que o telescópio circulou pela Europa através dos mercadores holandeses. Ao se deparar com esta invenção, Galileu adquire um modelo e inicia suas experiências em sua casa. Primeiramente pega bacias preenchidas de água para que o reflexo do sol e da lua se projetem por intermédio da luneta. Galileu descobre, assim, que o sol possui manchas solares, e em  determinados momentos algumas explosões. Quando no período noturno, Galileu assesta seu telescópio em direção à superfície lunar, destaca que pertence naturalmente a sua natureza crateras e montes, contrariando completamente o que Platão defendia em sua cosmologia.

Como conclusão geral do texto, é preciso enfatizar que existem ao menos, três elementos revolucionários nos trabalhos de Copérnico e Galileu, sem levar em consideração as realizações de Johannes Kepler:

A primeira revolução no pensamento científico se dá com Copérnico, na tentativa de mudar os paradigmas envolvidos na astronomia ptolomaica.

Já Galileu opera a transformação no modo de pensar os fenômenos físicos da queda dos corpos, por intermédio de experimentos caracterizados pela eficiência de seus resultados.

Em certo sentido, Galileu destrói, ao analisar a lua e o sol, o cosmo hierárquico implantado por Aristóteles e Platão, pois se o mundo supralunar é perfeito, a lua não poderia conter crateras, e muito menos o sol teria manifestações de manchas e explosões.

Os historiadores da ciência como Kuhn e Duhem entendem que houve uma transformação nos pontos de vista do homem neste instante. Thomas Kuhn defende a concepção de que Copérnico e Galileu, assim como Kepler, inauguram uma nova fase do pensamento físico através do fato de que introduzem um novo paradigma na interpretação dos fenômenos da natureza. Para o filósofo francês Pierre Duhem, em seu ‘Sistema do Mundo’, considera que o milagre e a ruptura no modo de ver o mundo físico, por Copérnico e Galileu, se deu de maneira gradual. Então, a mudança de paradigma não aconteceu através de uma revolução imediata e radical, mas, sim, paulatinamente. Se esta discussão é controversa, podemos dizer que talvez os dois lados tenham contribuição fundamental. Respalda-se a concepção de Duhem, com o fato de que a experiência dos recipientes cheios de líquidos de densidades diferentes, foi um experimento também executado por Filopono de Alexandria no século VI a C.

Paulo César Gomes de Souza

Mestrando em Filosofia da Ciência - Unicamp

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1) Koyrè, A - Do Mundo Fechado ao Universo infinito, ed. Universidade de Brasília

 2) Koyrè, A. - Estudos de História do Pensamento Científico, Ed. Universidade de Brasília.  3) Galileu Galilei - Duas Novas Ciências, Instituto Italiano di Cultura.

 

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