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Refletindo sobre a Bioética...

       

         Muitos são os argumentos contra ou a favor da eutanásia, provavelmente um dos mais comuns defende que há no mundo uma população demasiado grande para a quantidade de alimento que era possível produzir, tal visão assustadora parecia nas entrelinhas  estar dizendo que a solução evidente consistiria em reduzir a população mundial. Afirmava-se, ainda, que era preciso fazer com que a produção alimentícia chega-se a todos, porém, tristemente diminuindo o número desse “todos”, e não como seria louvável encontrando as formas adequadas e justas de produzir mais, ou de distribuir melhor o que se produzia. Apontavam para um paraíso no qual aqueles felizardos escolhidos (ou seriam sobreviventes?) poderiam, desta forma, usufruir um excelente nível de vida, pois, assim se acabaria com a pobreza.

          Ora, convenhamos, dizer que eliminando os pobres, elimina-se a pobreza é evidentemente um crime: a pobreza é fruto da miséria dos corações, portanto, eliminar os pobres não significa eliminar a causa.Felizmente, essa teoria não resistiu a uma análise racional e humana da realidade que nos cerca. Efetivamente precisamos enveredar por caminhos que, mesmo exigindo maior esforço e risco, são mais humanos.

          A questão bioética na contemporaneidade tem-se alastrado em meio aos debates filosófico-científicos por todo o mundo. O avanço da ciência nos permitiu conhecer melhor e manipular os processos de estruturação, transmissão e dinâmica da vida humana, aperfeiçoaram o conhecimento e as técnicas de salvar, bem como, as de abortar; potencializaram os transplantes, bem como, multiplicaram-se os doutores da morte; bebês nascem todos os dias acolhidos pelos pais risonhos e por um mundo que os desafia a construir novas realidades com os seus talentos, mas, também, poderiam ser estes aqueles bebês eliminados que muito possivelmente nasceriam com alguma imperfeição. 

          Temo pelo momento no qual  a vida já não tiver para nós aquele sabor de mistério e de sequiosidade diante do futuro, aquela qualidade que julgarmos essencial em nós: o vir-a-ser, não podemos aceitar meios de terminar com a vida de forma “doce”, praticando a eutanásia... um fast-food existencial no qual saboreamos o big-mac do fim antecipado.

             Muitos sonham com a data magna na qual seja possível escolher todas as características do novo ser que vai nascer: sua cor de cabelo, inteligência, olhos azuis ou verdes, físico de elite etc. Somos tentados diante da possibilidade de idealizar o ser perfeito, todo de acordo com o nosso gosto. Somos adeptos da perfeição...queremos clonar e multiplicar os belos corpos, porém, esquecemos dos belos corações. Criamos a perfeição através de meios imperfeitos; ambições satisfeitas pagando o preço de vidas desfeitas.

             Julgo degradante, criminoso, vil falar de possibilidades da ciência esquecendo-se que a inteligência  foi feita para o homem e não o homem para a inteligência, bem como a ciência.

             Parâmetros da maioria ou originários da força das tendências que construímos na nossa sociedade nem sempre são isentos de erro, aparentes boas intenções não excluem a possibilidade de cometer erros ou permitir anomalias. Hitler e seus sequazes foram os arautos da perfeição, portanto, devemos estar atentos: mais do que perfeição é preciso construir Possibilidades. Ao tentarmos construir novos Einsteins, esquecendo-nos da primazia da vida e da conduta ética, podemos estar dando à luz os novos Frankensteins. A maioria das pessoas inquiriu, uma ou outra vez, se é justo que existam pobres e ricos, sãos, cegos e aleijados, fugimos e trememos diante das palavras câncer e aids. Tal questionamento talvez seja  fruto danossa visão restrita de felicidade, por exemplo: não compreendemos que um deficiente possua a capacidade de ser feliz com a sua deficiência. Tristemente, atrelamos a nossa felicidade ao ter e não ao ser.

              Cientificamente, nos empenhamos com todas as forças  diante da tarefa de eliminar da terra as injustiças e os erros da natureza, precisamos esconder a todo o custo acabar com as anomalias, ou será, simplesmente a preocupação com aquilo que não conseguimos compreender.

              Deficientes e doentes sabem sorrir e ensinar sorrir. Em leitos hospitalares, encontrei muitas vezes entre aqueles que padecem a cruz da dor, pessoas de alto quilate humano, corações que brilham e iluminam, são os luminares da esperança e da força multiplicada na fraqueza. Os corpos exilados que cantam como sabiás em seu leito e digo, sem medo, que as aves que na dor gorjeiam não gorjeiam como as de cá.  Somente os verdadeiramente grandes sabem aceitar a profundidade de sua pequenez.

                No dia-a-dia da vida, tantas mães amam seus rebentos problemáticos na saúde que não teriam escolhido em sã consciência, e que, ao amá-los, descobriram a amplitude de sua própria força até então desconhecida, dariam mesmo suas próprias vidas pelos filhos e não trocariam os seus filhos por nenhum outro, por mais bonito e saudável que fosse.

                Diante de tais reflexões, podemos entoar em uníssono: Viva a Vida ! Somos Pessoas construindo realidades a partir de possibilidades e, é bom notar, que também é possível construir a realização do impossível.

 

Ronaldo Ronil

Licenciado em Filosofia/Unisantos

 

 

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